Réus investigados com base apenas em interceptações são absolvidos pelo TRF-2

Sem provas suficientes da prática dos crimes, a 1ª Turma Especializada do Tribunal Regional Federal da 2ª Região absolveu mais de 30 réus acusados de corrupção e quadrilha. As condenações diziam respeito a investigações datadas de 2006 envolvendo quadros de policiais, desembargadores e juízes.

Dentre os absolvidos, um policial civil e um empresário eram clientes do escritório Luchione Advogados. Eles haviam sido condenados com base em ligações telefônicas, mas não foram constatadas provas de corroboração.

Sem prova robusta

O policial civil foi condenado em primeira instância por corrupção passiva e associação criminosa. Conversas telefônicas apontariam entrega de dinheiro, repasse de informações sigilosas, cooptação de policiais para atuarem na quadrilha e omissão na repressão a jogo ilegal. Em sua defesa, o agente alegou possuir apenas relação de amizade com outro policial com o qual manteve diálogos telefônicos.

A desembargadora Simone Schreiber, relatora do caso, não verificou prova robusta de solicitação, recebimento ou promessa de pagamento ao réu. Quanto à quadrilha, sequer houve menção a outros membros do grupo criminoso.

Segundo ela, não houve "prova inequívoca" de que os valores mencionados nos áudios estivessem relacionados ao pagamento de propina. "Os diálogos parecem se referir a um empréstimo a juros, pois o réu pegaria um valor menor e devolveria um valor maior, talvez não associado ao grupo criminoso", assinalou.

Na conversa entre os policiais também não houve referência a "termos rotineiramente utilizados para menção dissimulada a dinheiro". Assim, "remanesce dúvida sobre a efetiva entrega de valor em espécie" e "não há qualquer outra prova que corrobore o recebimento de vantagem indevida".

As interações entre o réu e o interlocutor poderiam ser interpretadas "no contexto do coleguismo ou da amizade entre os policiais", como alegado pela defesa.

Relacionamento com a irmã

Já o outro cliente do escritório foi condenado em primeiro grau por corrupção ativa. Ele teria oferecido propina a um escrivão e a um delegado da Polícia Federal para que confeccionassem um relatório sugerindo o arquivamento de um inquérito.

Os advogados alegaram que o empresário se encontrou com o escrivão porque tinha um relacionamento com sua irmã. Nesta oportunidade, conheceu rapidamente o delegado, sem saber do cargo que ocupava na Polícia Federal.

Simone também não observou "prova suficiente para embasar a manutenção da sentença". Os diálogos dos telefonemas interceptados indicariam somente que o escrivão teria vendido um veículo que era do empresário e que tinha sido informalmente dado a sua irmã, o que poderia explicar a aproximação entre os dois.

"Não há qualquer referência, nos telefonemas interceptados, ao oferecimento/promessa/recebimento de vantagem indevida em contrapartida à prática de ato de ofício, qual seja, a confecção de um relatório policial favorável, sugerindo o arquivamento do inquérito", ressaltou a magistrada.

Também não houve menção ao número do inquérito, a valores em dinheiro ou mesmo ao objetivo do encontro ocorrido. A PF efetuou diligência para acompanhar o encontro, mas não informou o motivo do episódio nem qualquer ato que indicasse o pagamento de propina.

O advogado Carlo Luchione diz que o "mito de condenações com base em interceptações telefônicas sem prova de corroboração finalmente caiu por terra, gerando diversas absolvições, embora tardias". Para ele, "nada irá reparar reputações e o longo tempo de prisão que vários amarguraram".



Comentários


Nenhum Comentário publicado ainda.



Envie seu Comentário

Utilize os campos abaixo para comentar a notícia acima (publicação sujeita à análise dos administradores):



Notícias e Matérias que Podem lhe Interessar:

➤ Reanálise de interceptação após dez anos derruba ação por corrupção em SP➤ STJ: Ministro valida prova obtida por espelhamento do WhatsApp Web➤ TJ-RJ anula interceptações telefônicas por falta de assinatura da decisão