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A incerteza quanto à fidedignidade da prova apresentada pela acusação é motivo suficiente para garantir à defesa o acesso aos arquivos originais usados para a incriminação de alguém. Assim entendeu, por maioria, a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal nesta terça-feira (7/5) ao permitir que os advogados do empresário Ricardo Cosme Silva, investigado por tráfico de drogas, tivesse acesso às mensagens enviadas via Blackberry e usadas pela acusação, que, segundo eles, foram alteradas pela Polícia Federal.
Seguindo o voto do relator, ministro Gilmar Mendes, a 2ª turma aceitou a reclamação apresentada pela defesa contra decisão da Justiça do Mato Grosso, que negou acesso ao conteúdo de interceptações telefônicas enviadas pela fabricante do aparelho.
De acordo com a defesa, a negativa violava a Súmula 14 do Supremo, segundo a qual "é direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa". A Polícia Federal teria, conforme o advogado Arthur Barros Freitas Osti, editado o cabeçalho identificador, adicionando o nome dos supostos interlocutores em lugar dos números indicados originalmente pela empresa.
A instância originária informou que as edições feitas pela PF se deram apenas para facilitar a investigação e foram feitas somente nos cabeçalhos, sem que alcançassem o conteúdo das mensagens. O cabeçalho seria totalmente independente do conteúdo das mensagens, não sendo possível alterar o fluxo de dados do arquivo.
No entanto, segundo o ministro Gilmar Mendes, estabeleceu-se uma situação de dúvida sobre a confiabilidade dos dados apresentados pela PF. Gilmar leu trechos dos depoimentos prestados sobre o tema em que a autoridade policial afirma não ter conhecimento técnico acerca de algumas questões colocadas.
"Assim, a incerteza sobre a fidedignidade das investigações impõe a adoção de medidas para proteção da cadeia de custódia das informações", afirmou. Para o ministro, cada uma das etapas da operação que realizou a interceptação das comunicações deve ser preservada, para assegurar a integridade do procedimento probatório. O exercício do poder punitivo estatal, disse o relator, pressupõe a existência de uma condenação proferida após o transcurso de um processo penal com o devido respeito aos direitos e às garantias fundamentais.
O relator enfatizou que os atos estatais devem ser confiáveis. Portanto, quando há dúvidas sobre a persecução penal, medidas precisam ser tomadas para resguardar a legitimidade da atuação. "A reconhecida alteração dos cabeçalhos não comprova automaticamente modificação no conteúdo das interceptações, mas os arquivos eram editados pelas autoridades investigativas e essa é a problemática”, disse. Gilmar Mendes determinou também o reinício do prazo para recurso de apelação após o acesso dos arquivos pela defesa.
Acompanharam o voto do relator os ministros Cármen Lúcia, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. Apenas Luiz Edson Fachin divergiu. Para ele, os documentos foram disponibilizados para todas as partes. "As mensagens encaminhadas pela Blackberry foram entregues de forma zipada. Esse conteúdo não foi alterado. Há de se fazer uma diferenciação entre acesso e conteúdo. O acesso, no conteúdo integral, tal como fornecido pela empresa canadense esteve e está à disposição da acusação e da defesa", argumentou.
O empresário foi condenado pelo pela Subseção Judiciária de Cáceres (MT) à pena de 13 anos e 10 meses de prisão no âmbito da chamada operação hybris, deflagrada para apurar a prática de crimes contra o sistema financeiro nacional e de lavagem de dinheiro. Segundo os autos, o empresário era um dos líderes de uma organização criminosa dedicada ao tráfico internacional de drogas compradas na Bolívia e distribuídas em vários estados da federação, especialmente São Paulo, Minas Gerais, Maranhão, Goiás e Pará.
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