Laudo sobre conversas no celular de chefe da segurança de Rogério Andrade pode ajudar bicheiro a sair da cadeia

Perito atesta não ser possível garantir integridade e autenticidade de arquivos telemáticos de Márcio Araújo, que registram a fala do contraventor: 'O Cabeludo é o que interessa!', referindo-se a Iggnácio

Preso há 10 meses na Penitenciária Federal de Campo Grande (MS), o bicheiro Rogério Andrade pode ser beneficiado pelas conclusões de um laudo do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE), a depender do entendimento do Judiciário. O documento atesta que não é possível garantir se houve ou não manipulação de arquivos extraídos da quebra telemática (nuvem) do sargento da reserva Márcio Araújo de Souza, chefe da segurança do contraventor.

É justamente nesse material que consta a principal prova contra Rogério: um print de diálogo atribuído a ele e ao seu chefe de segurança, identificados como "capitan Jacks" e "Lobo 009", respectivamente, pelos investigadores do Grupo de Atuação Especializada no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio (MPRJ). Segundo os promotores, "capitanJacks" (referência ao personagem Jack Sparrow, da franquia Piratas do Caribe) seria o perfil usado por Rogério. A suposta ordem para o assassinato teria sido enviada por meio de mensagem cifrada em um aplicativo com criptografia de ponta a ponta: “Cabeludo é o que interessa!”.

Na interpretação dos analistas do MPRJ, “Cabeludo” seria o contraventor Fernando Iggnácio, assassinado em 10 de novembro de 2020, em uma emboscada em um heliporto no Recreio, Zona Oeste do Rio. O MPRJ denunciou Rogério, Márcio Araújo e outros quatro policiais militares — um deles morreu no curso do processo — pelo homicídio. Rogério é apontado como mandante do crime, com base em novas investigações conduzidas pelo Gaeco em outubro do ano passado. A motivação seria a disputa por poder e pelo espólio de Castor de Andrade, morto em 1997 em decorrência de um ataque cardíaco.

O que diz o laudo da Polícia Civil

O laudo do ICCE foi anexado no último dia 17 à ação penal em curso na 1ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça da capital contra Márcio Araújo, mas pode ser usado como prova emprestada no processo de Rogério Andrade. O perito Vinicius Trindade, especializado em informática forense, respondeu a 23 quesitos formulados pelo Ministério Público e pela defesa técnica de Araújo. Segundo o Laudo de Dispositivo de Armazenamento Computacional nº 029994/2025, foram analisados um HD externo e 16 CDs, com lacres da Delegacia de Homicídios da Capital (DHC).

No documento, o perito afirma não ser possível "emitir juízo categórico sobre a integridade, autenticidade ou fidedignidade dos arquivos contidos nas referidas mídias, uma vez que não foram fornecidos os arquivos originais, nem demonstrada a cadeia de custódia completa desses materiais". Em outras palavras, o laudo aponta que não é possível descartar a possibilidade de alterações, pois não se sabe quem teve contato com os dados, onde foram encontrados, como foram armazenados e de que forma foram transportados. Na linguagem jurídica, isso caracteriza uma possível quebra da cadeia de custódia.

Diante disso, a defesa de Rogério pode requerer o uso do laudo do ICCE como prova emprestada — mecanismo que permite a utilização de evidências produzidas em outro processo —, já que seu conteúdo pode beneficiá-lo. Os advogados do bicheiro já haviam interrompido a audiência de instrução e julgamento, no dia 26 de junho, alegando justamente a ausência do laudo da Polícia Civil. Até então, somente o laudo produzido pela perícia do MPRJ constava nos autos, razão pela qual a defesa requereu a juntada do novo documento feito por peritos da Polícia Civil.

Apesar de o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entender que a quebra da cadeia de custódia pode acarretar a invalidação de provas, essa consequência não é automática. A defesa precisa demonstrar que o réu sofreu prejuízo concreto. Caberá, portanto, ao Judiciário decidir se houve comprometimento ao direito de defesa.

Procurada, a defesa de Rogério ainda não informou qual estratégia adotará. No entanto, no processo, os advogados se manifestaram na última sexta-feira (01/08), alegando que, como o laudo do ICCE ainda não estava concluído — até aquela data, o documento havia sido juntado apenas nos autos de Márcio Araújo, e não no processo de Rogério —, requereram o relaxamento da prisão preventiva do bicheiro. Baseada no laudo, a defesa de Araújo pediu à Justiça a retirada dos arquivos da quebra telemática dele.

O Ministério Público do Rio irá emitir uma nota sobre o caso nesta terça-feira (05/08).

Rogério está preso em presídio federal de segurança máxima com Regime Disciplinar Diferenciado (RDD). Já Araújo, encontra-se em liberdade.



Comentários


● Autor: Lorenzo Parodi - Data: 5/8/2025
Muito satisfeito! O laudo particular de minha lavra neste caso já informava todas estas questões. O Perito oficial reconheceu e confirmou (como não podia deixar de ser) tudo quanto já evidenciado.



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